A narrativa conta a estória de Ali, uma criança que perde os únicos sapatos da irmã Zahra. Como são filhos de uma família pobre, Ali propõe dividir os seus próprios sapatos com a menina trocando-os durante os turnos da escola. A trama se desenvolve circunscrevendo este fato em que Ali procura ressarcir a irmã e no decorrer da estória muitas emoções vêm à tona.
Percebemos que grande parte da vida dos personagens principais é passada correndo entre as vielas de Teerã no intuito de trocarem os sapatos, únicos para ambos. Estas vielas representam muitos dos obstáculos que tentamos transpor todos os dias, no meio do caminho da realização dos nossos projetos, mas também significam o próprio caminho, a estrada, o processo constante do ciclo da vida, o eterno recomeço. Às vezes, ansiando por chegar a algum lugar, a uma meta, nos esquecemos de contemplar o processo, o meio, a via de acesso, as coisas e acontecimentos ao redor que são, verdadeiramente, o fator de amadurecimento e experiência humana e por que não divina?
Podemos citar a proteção que Ali tem para com a irmã como exemplo de solidariedade, de uma fraternidade há muito tempo relegada como instrumento improdutivo em nossa sociedade capitalista na qual o lucro e a vantagem são substâncias obrigatórias nas relações sociais, profissionais e até mesmo religiosas.
As andanças de Ali são sempre interrompidas bruscamente pelos momentos em que ele se refresca com a água. A mesma é presente no filme de várias maneiras. Neste contexto, a água simboliza o alívio, a refrescância, apaziguamento, a serenidade, pois esta sempre aparece nos instantes críticos e estressantes da trama, quebrando a tensão existente entre as personagens e os conflitos interiores de Ali. Na cena final em que ele, após vencer a corrida, coloca os pés machucados e fatigados na água, o peixe surge como outro elemento simbólico para reforçar esta sensação de leveza. Podemos ainda fazer uma analogia religiosa quando os peixes parecem “lamber” as feridas de Ali. É interessante lembrar que o peixe é um dos símbolos do cristianismo, já que a palavra peixe, em grego ichtus, forma as iniciais da frase: "Jesus Cristo de Deus Filho Salvador".
Certamente, esse filme ainda tem muito a acrescentar a todos nós que buscamos sejam soluções práticas que a vida nos implica como também um sentido para a vida, uma resposta, algo que transcende às especulações e explicações científicas. A narrativa não se esgotará semanticamente nesta breve reflexão.

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